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Como não só ler, mas meditar - C. H. Spurgeon



Alguns trechos bíblicos ficam claros diante dos nossos olhos — pastos baixos e abençoados onde os cordeiros podem se alimentar; existem, no entanto, profundezas onde nossa mente poderia antes afogar-se do que nadar com prazer, se ela chegasse até lá sem cautela. Existem textos das Escrituras que foram feitos e construídos com o propósito de nos levar a pensar. Por esse meio, inclusive, nosso Pai celestial quer nos educar para o céu — fazendo-nos penetrar nos mistérios divinos com a nossa mente. Por isso, Ele nos oferece a sua Palavra de uma forma às vezes complexa, para nos compelir a meditar sobre ela, antes de chegarmos à sua doçura. Ele poderia ter explicado tudo de tal maneira que captássemos o pensamento num só minuto, mas não foi da vontade dEle fazer assim em todos os casos. Muitos dos véus que são lançados sobre as Escrituras não têm a intenção de ocultar o significado aos leitores diligentes, mas de compelir a mente a ser ativa, pois muitas vezes a diligência do coração em procurar saber a vontade divina faz mais bem ao coração do que a própria sabedoria obtida. A meditação e o esforço mental cuidadoso servem como exercício e fortalecimento da alma, que passa a ficar em condições de receber verdades ainda mais sublimes.


Precisamos meditar. Essas uvas não produzem vinho até serem pisadas por nós. Essas azeitonas precisam ser colocadas debaixo da roda, e prensadas repetidas vezes, para que o azeite flua delas. Olhando para um punhado de nozes, percebemos quais delas já foram comidas, porque há um buraquinho onde o inseto furou a casca — só um buraquinho, e lá dentro há uma criatura vivente comendo a noz. Ora, é uma coisa maravilhosa furar a casca da letra, para então ficar por dentro comendo a própria noz. Bem que eu gostaria de ser um vermezinho assim, vivendo dentro da Palavra de Deus, alimentando-me dela, depois de ter aberto caminho através da casca e ter chegado ao mistério mais interior do evangelho bendito. A Palavra de Deus sempre é mais preciosa para o homem que mais se alimenta dela.


No ano passado, sentado debaixo de uma faia nogueira que se estendia em todas as direções, e admirando aquela árvore tão maravilhosa, pensei comigo mesmo: Não tenho nem a metade da estima por essa faia do que o esquilo tem. Vejo-o, pulando de galho em galho, e tenho certeza que ele dá muito valor àquela velha faia, porque tem seu lar em algum oco dentro dela, os galhos são o seu abrigo, e aquelas nozes de faia são o seu alimento. Ele vive da árvore. É seu mundo, seu pátio de recreio, seu celeiro, seu lar; realmente, é tudo para ele; mas para mim, não, porque obtenho meu repouso e minhas refeições em outro lugar. No caso da Palavra de Deus, é bom sermos como esquilos, habitando nela e vivendo dela. Exercitemos nossa mente, pulando de galho em galho na Palavra; achemos nela o nosso repouso e façamos dela o nosso tudo. O proveito será todo nosso, se fizermos dela nosso alimento, nosso remédio, nosso tesouro, nosso arsenal, nosso repouso, nossa delícia. Que o Espírito Santo nos leve a fazer assim, tornando a Palavra tão preciosa à nossa alma!


Oração ao Autor da Palavra:

Agora, quero fazê-lo lembrar que, para obter proveito da Palavra, teremos de orar. É uma coisa excelente sermos forçados a pensar, e coisa mais excelente ainda é ser forçado a orar pelo fato de ter sido levado a pensar. Não é verdade que estou falando com alguns de vocês que não lêem a Palavra de Deus, e que estou falando com muitos outros que a lêem, mas sem nenhuma resolução firme no sentido de entendê-la? Sei que esta é a realidade. Você quer começar a ser um leitor verdadeiro? Então, precisa dobrar os joelhos. Você deve orar a Deus, pedindo orientação. Quem entende melhor um livro? O próprio autor dele.

Se quero verificar o verdadeiro significado de uma frase um pouco complexa, e o autor mora perto da minha casa e tenho condições de visitá-lo, vou tocar a campainha da porta dele e dizer-lhe: "O senhor pode ter a gentileza de me dizer qual o significado original daquela frase? Não tenho a mínima dúvida de que ela faz muito sentido, mas eu sou inculto demais para percebê-lo. Não tenho o conhecimento e o domínio do assunto que o senhor possui, e, portanto, suas alusões e descrições estão além do meu alcance. Para o senhor, é um lugar-comum, bem dentro do seu alcance, mas para mim é difícil. O senhor teria a bondade de me explicar o significado?" Um bom homem teria prazer em ser tratado assim, e não teria nenhum problema em deslindar o significado a um leitor interessado e sincero. Assim, eu teria a certeza de obter o significado correto, porque estaria indo à fonte original ao consultar o próprio autor.


Da mesma maneira o Espírito Santo está conosco, e quando tomamos na mão o Livro dEle e começamos a lê-lo, e queremos saber o significado, devemos pedir que o Espírito Santo nos ensine. Ele não operará um milagre, mas Ele inspirará a nossa mente, e Ele nos sugerirá pensamentos que nos levarão através da ligação natural entre eles, até finalmente chegarmos ao cerne e ao âmago de sua instrução divina.


Portanto, procure com muita sinceridade a orientação do Espírito Santo, porque, se a própria alma da leitura é o entendimento daquilo que lemos, logicamente devemos invocar o Espírito Santo em oração, pedindo que Ele desvende os mistérios secretos da Palavra inspirada.


Usando Meios e Ajudas:

Se temos pedido assim a orientação do Espírito Santo, segue-se que estaremos dispostos a usar todos os meios e ajudas para entendermos as Escrituras. Quando Filipe perguntou ao eunuco etíope se este entendia a profecia de Isaías, o eunuco respondeu: "Como poderei entender, se alguém não me explicar?" Em seguida, Filipe subiu à carruagem e abriu-lhe a Palavra do Senhor.


Alguns, sob o pretexto de estar sendo ensinados pelo Espírito Santo, se recusam a ser instruídos por livros ou por homens. Essa atitude não honra ao Espírito de Deus; pelo contrário, desrespeita-O, porque se Ele dá a alguns dos seus servos mais luz do que dá a outros — e é claro que Ele dá — esses estão obrigados a transmitir essa luz aos outros, e usá-la para o bem da igreja. Se, porém, o restante da igreja se recusa a receber essa luz, com que propósito o Espírito de Deus a deu? Nesse caso, haveria a sugestão de que há algum erro na dispensação dos dons e das graças, que é dirigida pelo Espírito Santo. Não pode ser assim. É do beneplácito do Senhor Jesus Cristo dar mais conhecimento e entendimento da sua Palavra a alguns dos seus servos do que a outros, e nossa parte é aceitar com alegria o conhecimento que Ele dá, da maneira que Ele quer dá-lo.


Seria muita iniqüidade nossa dizermos: "Não queremos os tesouros celestiais que existem em vasos de barro. Se Deus nos der o tesouro celestial com a sua própria mão, nós o aceitaremos, mas não através de vasos de barro. Pensamos que somos suficientemente sábios, com mentalidade celestial, e muito espirituais para dar valor às jóias quando estão colocadas em vasos de barro. Não queremos ouvir a ninguém, e não queremos ler algo além da Bíblia, nem queremos aceitar alguma luz a não ser aquela que passa por uma fenda em nosso próprio telhado. Não queremos ver com a claridade da vela de outro; preferimos permanecer na escuridão". Irmãos, não caiamos em semelhante insensatez. Se a luz vier da parte de Deus, mesmo que seja trazida por uma criança, nós a aceitaremos com alegria. Se algum dos servos dEle, seja Paulo, ou Apolo, ou Cefas, tiver recebido luz, eis que "todas as coisas são vossas, e vós, de Cristo, e Cristo, de Deus"; aceite, portanto, a luz que Deus acendeu, e peça graça suficiente para focalizar essa luz na Palavra, de modo que, ao lê-la, você possa entendê-la.


Não quero dizer muito mais a respeito disso, mas gostaria de fazê-lo sentir essas verdades. Você tem a Bíblia em casa, eu sei; você não gostaria de ficar sem a Bíblia; e pensaria que é um pagão, se não a tivesse. Você tem a Bíblia e talvez ela seja muito bem encadernada, um exemplar de aparência excelente; as páginas não foram muito viradas nem gastas, e não correm tal risco, porque apenas saem aos domingos para tomar o ar, e durante o restante da semana ficam guardadas junto aos lenços perfumados de alfazema. Você não lê a Palavra, não a perscruta, e como poderá esperar que receberá a bênção divina? Se não vale a pena escavar para achar o ouro celestial, não há a probabilidade de descobri-lo. Várias vezes já lhe falei que escrutinar as Escrituras não é o caminho da salvação. O Senhor tem dito: "Crê no Senhor Jesus Cristo, e serás salvo". Mesmo assim, a leitura da Palavra freqüentemente leva, assim como o ouvir da Palavra, à fé, e a fé traz a salvação; porque a fé vem pelo ouvir, e a leitura é um tipo de ouvir. Enquanto você procura saber o que é o evangelho, pode ser do agrado de Deus abençoar a sua alma.



Mas que quantidade inferior de leitura alguns de vocês dedicam às suas Bíblias! Não quero dizer nada que seja demasiadamente severo por não ser rigorosamente verdadeiro — que falem suas próprias consciências — mas não deixo de tomar a liberdade de perguntar: Não é verdade que muitos de vocês lêem a Bíblia de maneira muito apressada — só um pouquinho, e saem correndo? Alguns de vocês não se esquecem, pouco tempo depois, de tudo quanto leram, perdendo até mesmo o pouco efeito que parecia ter? Quão poucos de vocês estão resolutos no sentido de chegar até ao âmago da Palavra, ao seu suco, à sua vida, à sua essência, e a beber do seu significado! Se você não fizer assim, digo-lhe, de novo, que a sua leitura é leitura miserável, leitura morta, leitura sem proveito; não é leitura de modo algum, e até o nome de leitura seria impróprio. Que o Espírito Santo lhe dê arrependimento quanto a este assunto.

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